Eficiência energética, economia e sustentabilidade: como bares e restaurantes estão transformando seus processos e reduzindo custos com a adoção de energias renováveis
“Na natureza, nada se cria, nada se perde, tudo se transforma”: a célebre frase atribuída ao químico francês Antoine Laurent de Lavoisier é a síntese de todo o processo de produção, venda e consumo nos restaurantes da Fazenda Jerivá, localizados em Goiás.
Com cerca de 400 funcionários nas dependências das empresas, todos os insumos que vão para a mesa do consumidor são orgânicos e produzidos dentro da fazenda, para garantir a qualidade do que chega aos clientes.
“A ideia de aliar o conceito da fazenda à mesa sempre foi uma diretriz do nosso negócio, e nos mantemos fiéis a esse propósito até hoje, mesmo após quase 50 anos de operação”, diz Fernando Benko, um dos sócios da empresa.
O negócio nasceu de uma pequena banca em Abadiânia, na estrada entre Goiânia e Brasília. Lá, os pais de Fernando, João Benko e Divina Maria, vendiam plantas ornamentais.
A operação se expandiu a partir do aumento da demanda, e hoje, além da fazenda, existem quatro restaurantes e uma cozinha industrial, tudo para garantir autonomia no processo de produção, inclusive, no consumo de energia elétrica. E isso tem acontecido por meio de energia renovável que não degrada o meio-ambiente.
Atualmente, a fazenda tem um “mix de fontes de energia”: parte do consumo elétrico do local é adquirido no Mercado Livre de Energia (espaço competitivo onde é possível comprar energia elétrica alternativa ao serviço prestado pela concessionária), biogás, proveniente dos resíduos gerados na fazenda, e a energia solar, que supre os restaurantes da Fazenda Jerivá.
“Produzimos entre quatro e cinco mil litros de leite diariamente em nossa pecuária leiteira, e os resíduos gerados, tanto sólidos quanto líquidos, são cuidadosamente processados. O resíduo sólido se transforma em uma fibra, que reutilizamos como cama para as vacas, enquanto o líquido vai para o biodigestor, com capacidade para 1,5 milhão de litros."
Mas e o bolso?
Quando se fala em energia renovável, é de senso comum que se pense em um gasto alto para sua adoção. Porém, é preciso ter em mente que isso não pode ser visto como despesa, mas como investimento.
Com o Mercado Livre de Energia, energia solar e o biogás, Fernando afirma: quando há aumento da bandeira tarifária, não há impacto significativo na conta de energia da fazenda ou dos restaurantes. “Isso porque no Mercado, o contrato de compra de energia está fixo por até 70 meses. Ou seja, ainda que haja variação nas taxas sobre a conta de energia, elas não influenciam".
"Há cerca de um ano, quando os reservatórios das hidrelétricas estavam cheios e a bandeira tarifária era a verde, a gestão da Fazenda Jerivá se programou para comprar a energia no Mercado Livre, ação que fez toda a diferença. Além disso, a autossuficiência energética da fazenda, por meio do biogás, proporciona uma segurança adicional”, conta.
Quando o segundo sol chegar...
Marilda Ribeiro é proprietária do Graffica Bar, no centro de Belo Horizonte (Minas Gerais). O nome do estabelecimento é uma referência a um dos seus primeiros negócios, uma gráfica criada em 1994, mas que passou a ficar ultrapassada por conta do avanço da tecnologia e a consequente redução no número de impressões.
Daí ela teve a ideia de transformar o espaço em um bar localizado no edifício Maletta, um dos pontos mais tradicionais da capital mineira. O lugar é cheio de referências a tipografias, decorado com jornais antigos e tem até uma grande prensa, que era utilizada para as impressões.
A energia que movimenta essa atmosfera vem energia solar, gerada no sítio de Marilda, o “Amigos da Natureza”. A ideia de adotar uma energia mais limpa surgiu durante a pandemia e ela afirma: “Essa foi uma das melhores decisões que tomei. Sinto muito orgulho por estar contribuindo para um planeta mais sustentável.”
“Construí minha própria usina solar no meu sítio, e ela gera 100% da energia que preciso. Além de usá-la no meu negócio, também a utilizo na minha casa”, conta.
Energia renovável na prática: benefícios para o negócio e para o planeta
Segundo o professor do curso de Engenharia Elétrica e diretor do Centro de Tecnologia da Universidade Federal do Piauí (UFPI), Marcos Lira, os principais tipos de energia renovável (ou energia limpa) são a solar, eólica, de biomassa e a hidrelétrica.
A energia hidrelétrica é responsável por cerca de 54% de toda energia gerada no país. Aqui, a força das águas transforma a energia mecânica das pás em energia elétrica. Já a energia solar fotovoltaica converte a luz do sol em eletricidade por meio de painéis solares. Esse modelo já alcança aproximadamente 19% da matriz elétrica renovável no país.
A energia eólica é captada através de grandes turbinas, que aproveitam o movimento do vento e o transformam em geração de energia elétrica. Muito forte no Nordeste e no Sul do país, ela representa entre 11% e 12% da matriz energética brasileira.
E por fim, a energia de biomassa ou biogás é produzida a partir da queima de resíduos orgânicos. Isso gera gás metano que, por sua vez, produz energia elétrica.
O que talvez muitas pessoas não saibam, é que em tempos de seca assídua, quando o nível dos reservatórios está abaixo do adequado para funcionamento e há aumento da bandeira tarifária, a adoção de energias renováveis pode ajudar o negócio a não ser tão impactado pelo acréscimo na conta de energia.
Antes de entender de que forma o uso de energias limpas no negócio pode ajudar a reduzir custos, é preciso entender o que são as bandeiras tarifárias de energia e quais os seus patamares:
• A bandeira verde sinaliza a capacidade adequada de funcionamento das hidrelétricas e sem acréscimo na conta de energia
• A bandeira amarela é um indicativo de que os reservatórios estão em níveis mais baixos e gerando alerta sobre a necessidade de economia de energia, onde há acréscimo de R$ 1,88 a cada 100 quilowatt-hora
• A bandeira vermelha – patamar 1 indica a situação crítica dos reservatórios, havendo necessidade de acionar as termelétricas; aqui, é cobrado R$ 4,46 a cada 100 kWh)
• A bandeira vermelha – patamar 2 sinalizando o cenário mais grave, no qual os reservatórios estão muito baixos e uma grande quantidade de energia térmica é utilizada; a conta fica R$ 7,87 mais cara a cada 100 kWh consumidos.
O professor Marcos Lira explica que o aumento da conta de energia visa custear os gastos com o uso das termelétricas, mas também tem um efeito pedagógico, já que estimula a economia de energia.
Uma pesquisa realizada pela Abrasel em parceria com o Sebrae, indicou que 74% dos clientes consideram “muito importante” que o bar ou restaurante tenha práticas que minimizem ou reduzam o impacto do negócio no meio ambiente.
Porém, a pergunta que permanece é: o investimento vale a pena? Para o professor Lira, a resposta é sim.
“Quando uma residência ou estabelecimento adota energia solar ou outras formas de geração própria de eletricidade, o impacto financeiro é imediato. Ao gerar sua própria energia, você reduz a dependência do fornecimento da rede elétrica, resultando em economia direta”, explica.
*Texto adaptado da edição 159 da revista B&R